COMO JUDAS MORREU E O CAMPO FOI COMPRADO POR QUEM?

 1. O CAMPO FOI COMPRADO POR QUEM? 

De acordo com Brauch (1984, pp. 434,435), no livro "PALAVRAS DIFÍCEIS DA BÍBLIA", a narrativa da morte de Judas por Lucas é bastante detalhada e sangrenta. No entanto, surge um problema quando comparamos Atos 01:18 com o relato de Mateus, que aparentemente apresenta uma história diferente. Em Mateus, é relatado que Judas jogou o dinheiro no templo, enforcou-se e os principais sacerdotes usaram o dinheiro para comprar o campo do oleiro, destinado à sepultura dos estrangeiros (Mt 27:5). Esses dois relatos não são contraditórios?

    É evidente que Mateus e Lucas abordam o incidente com diferentes preocupações. Mateus destaca a compra do campo, interpretando-a como um cumprimento das Escrituras. Ele faz uma conexão entre Zacarias 11:12-13 (as trinta moedas de prata e o Oleiro) e Jeremias 32:6-12 (a compra de um campo), possivelmente também fazendo referência a Jeremias 18:1-4 (a visita à casa do oleiro), e atribui todas essas referências a Jeremias (ver comentário em Mt 27:9-10).

    Por outro lado, Lucas está mais interessado em mostrar que Judas teve um destino trágico e merecido, uma morte horrível. Essa ênfase é semelhante a outra narrativa em Atos 12:21-24, onde o autor descreve a morte de Herodes Agripa I. Em vez de enfatizar a compra do campo, que poderia ser vista como uma recompensa, especialmente para os judeus, para quem a posse de terras na Palestina era importante, Lucas foca na maneira terrível como Judas encontrou seu fim no campo. 

    Ambos os autores buscam destacar o significado do campo sendo chamado de "O Campo de Sangue", embora atribuam razões diferentes para esse título. Em Atos, parece haver uma conexão entre o nome e o sangue derramado de Judas em sua morte, enquanto Mateus relaciona o nome ao fato de que o campo foi adquirido com o dinheiro do sangue pago por Judas. Essa dualidade de significados não é surpreendente, pois o mesmo nome pode ter diferentes conotações para pessoas diferentes.

    Uma análise mais detalhada das duas narrativas revela lacunas que levantam dúvidas sobre os eventos. No entanto, as contas não são necessariamente contraditórias. Em Atos, o foco está na associação do dinheiro de Judas com a compra do campo e a consequente atribuição do título "Campo de Sangue". Se os principais sacerdotes de fato compraram o campo, talvez em algum momento após a morte de Judas, não seria uma preocupação detalhada para o autor. O ponto principal era que o dinheiro de Judas foi utilizado para adquirir o campo, resultando no título significativo.

    Além disso, outra razão possível para o nome, que também é destacada em Atos, pode ser o estado horrível em que o corpo de Judas foi encontrado após sua morte. Seus intestinos derramados e a subsequente desfiguração de seu corpo, possivelmente sendo parcialmente devorado por animais, eram considerados horríveis para os judeus, que valorizavam um enterro adequado. Na visão deles, formas de execução que não desfiguravam o corpo externamente eram preferíveis às que causavam desfiguração, como o apedrejamento, considerado a pior forma de execução. Assim, o nome "Campo de Sangue" também pode ter sido uma referência a essa brutalidade associada à morte de Judas. (Brauch, 1984, pp. 434,435)

Temos também uma esplicação sobre esse assulto e bate com o de Brauch no livro de EW Bullinger: O Companheiro da Bíblia.

Com base na análise de EW Bullinger: O Companheiro da Bíblia, Apêndice 161, examinamos a compra do "campo do oleiro", como descrito nos registros de Mateus e Atos. Esses registros apresentam eventos relacionados à traição de Judas e à subsequente compra de um campo que ficou conhecido como "Campo de Sangue".

    No relato de Mateus (Mateus 27:3-8), após a traição de Jesus por Judas e sua subsequente condenação, Judas devolve as trinta moedas de prata aos anciãos, reconhecendo seu pecado ao trair o sangue inocente. Os anciãos decidem usar o dinheiro para comprar o campo do oleiro, que seria usado como cemitério para estrangeiros. Esse campo recebe o nome de "Campo de Sangue" devido à associação com o preço do sangue de Jesus.

    Em Atos (Atos 1:15-19), Pedro, falando aos discípulos reunidos, refere-se à profecia de Davi sobre Judas e sua participação na traição de Jesus. Ele menciona que Judas adquiriu um campo com o dinheiro obtido de sua iniquidade e, ao cair, suas entranhas se derramaram, tornando-se conhecido como "Acéldama" ou "Campo de Sangue".

     Para a maioria das pessoas, os pedaços de terra mencionados em Mateus 27 e Atos 1 são considerados os mesmos, e o "salário da iniqüidade" em Atos 1:18 é entendido como as trinta moedas de prata mencionadas em Mateus 27:3-5. No entanto, há razões para acreditar que isso não seja correto:

1. Compradores Diferentes:

Os compradores do terreno mencionado em Mateus 27 eram os príncipes dos sacerdotes, enquanto o terreno mencionado em Atos 1 foi comprado por Judas.

2. Dinheiro Diferente:

    O dinheiro usado para comprar os terrenos foi diferente. Em Mateus 27, o terreno foi comprado com as trinta moedas de prata que Judas jogou no templo, enquanto em Atos 1, o "salário da iniqüidade" usado por Judas para comprar o terreno não poderia ter sido essas moedas, já que ele as jogou no templo e não poderia usá-las novamente.

    Quanto à identidade e origem do "salário da iniqüidade", a frase indica dinheiro obtido de forma desonesta. Em II Pedro 2:15, as mesmas palavras gregas são traduzidas como "salário da injustiça", referindo-se ao dinheiro que Balaão recebeu por desobedecer a Deus. No caso de Judas, João 12:6 revela que ele era um ladrão que roubava da bolsa de dinheiro. Portanto, é provável que o "salário da iniqüidade" mencionado em Atos 1:18 fosse o dinheiro roubado da bolsa de dinheiro, usado por Judas para comprar o terreno.

3. Diferentes vocábulos em grego:

    Outro ponto que evidencia que os dois pedaços de terra não são os mesmos é o uso de palavras gregas diferentes para cada um deles. Infelizmente, essa distinção é muitas vezes perdida em traduções que utilizam a mesma expressão "campo de sangue" para ambos. No entanto, o texto grego destaca que apenas o terreno mencionado em Mateus poderia ser descrito como um "agros", que significa "campo".

    Por outro lado, a palavra grega usada em Atos 1:19 é "chorion", que significa "um lugar particular, propriedade fundiária, propriedade". Assim, enquanto os sacerdotes compraram um "agros", um campo, Judas adquiriu um "chorion", uma propriedade. Seguindo o texto grego, o terreno adquirido pelos sacerdotes foi chamado de "agros de sangue", enquanto o adquirido por Judas foi chamado de "chorion de sangue".

4. Motivos distintos para os seus nomes:

    Além disso, os dois terrenos receberam seus nomes por razões diferentes. O "agros de sangue" comprado pelos sacerdotes recebeu esse nome porque foi adquirido com o "preço de sangue", ou seja, as trinta moedas de prata pagas pela traição de Jesus. Já o "chorion de sangue" comprado por Judas recebeu esse nome porque foi o local de seu suicídio.

 5. Conclusão:

  Portanto, com base nessas evidências, fica claro que Atos 1:15-20 e Mateus 27:3-8 se referem a dois terrenos distintos.

O relato em Mateus 27 descreve a compra de um campo, chamado de "agros", pelos sacerdotes com as trinta moedas de prata que Judas devolveu. Esse campo ficou conhecido como "agros de sangue" devido ao fato de ter sido adquirido com o "preço de sangue", as trinta moedas de prata pagas pela traição de Jesus.

    Por outro lado, Atos 1 fala sobre uma propriedade, um terreno específico, chamado de "chorion", que foi comprado por Judas com o "salário da iniqüidade", ou seja, dinheiro obtido de forma desonesta, provavelmente roubado da bolsa de dinheiro dos discípulos. Esse terreno foi denominado "chorion de sangue" devido ao fato de Judas ter cometido suicídio lá.

    Essa distinção entre um campo e uma propriedade particular, além das diferentes origens do dinheiro utilizado para a compra, esclarece que os eventos descritos em Mateus 27 e Atos 1 referem-se a locais diferentes. Enquanto o "agros de sangue" está associado à traição de Judas e à compra pelo sumo sacerdote, o "chorion de sangue" está ligado ao suicídio de Judas e à sua aquisição desonesta do terreno. (Bullinger, 1994. Apêndice 161). 

    Outro ponto a se analisar é que “os principais sacerdotes” (Mt 27,6) “compraram um campo que passaria a ser um cemitério de forasteiros” (Mt 27.7), já em atos, “deserto sua morada” (At 1.20), cumprindo assim o livro dos Salmos 69,25; 109.8. E Mateus relata que se cumpre o que foi dito por  Jeremias, um cumprimento das Escrituras. Ele faz uma conexão entre Zacarias 11:12-13 (as trinta moedas de prata e o Oleiro) e Jeremias 32:6-12 (a compra de um campo), possivelmente também fazendo referência a Jeremias 18:1-4 (a visita à casa do oleiro), e atribui todas essas referências a Jeremias.

2. COMO  JUDAS MORREU

Champlin no seu Comentário do Novo Testamento interpretado, no Volume III, traz o sequente:

A morte trágica de Judas Iscariotes gerou um grande interesse, levando à criação de várias versões sobre a sua morte. No entanto, existem principalmente três tradições diferentes sobre a forma como ele faleceu.

1. A narrativa do livro de Atos sugere que a morte de Judas Iscariotes foi violenta, causada por uma queda incontrolável, possivelmente de um precipício.

2. Existe também a história de Mat. 27:3-10, que relata que Judas Iscariotes se enforcou.

3.  Da mesma forma, existe uma história preservada por Papias, discípulo do apóstolo João (ou do "presbítero"), que relata que Judas Iscariotes foi atacado por uma doença repugnante que causou um inchaço excessivo em seu corpo. Enquanto ele estava nessas condições físicas, foi esmagado por uma carroça em um local de passagem estreita, onde normalmente teria passado com sucesso se não estivesse tão inchado. Alguns intérpretes sugerem que essa história preservada por Papias é, na verdade, a mesma que é contada nas páginas do livro de Atos. A tradução que aparece como "... precipitando-se..." (comum a todas as traduções) pode, na verdade, ser a tradução de um termo médico obscuro (no grego, prestheis), que indicava um inchaço excessivo. Essa teoria é exposta no livro "The Beginnings of Christianity", editado por F.J. Foakes Jackson e Kirsopp Lake: Londres: The Macmillan Co., 1933, V, págs. 22-30.

Diferentes abordagens interpretativas: Este mesmo autor acrescenta: Para além das ideias acima mencionadas, surgiram várias outras interpretações, algumas delas de caráter apócrifo, outras como variações das tradições já existentes. Alguns intérpretes afirmam que as palavras "foi enforcar-se", na passagem de Mateus 27:5, deveriam, na realidade, ser traduzidas como "sufocou-se", deixando assim em aberto o modo real da sua morte. Outros estudiosos pensam que estas palavras significam que ele foi consumido pelo remorso da consciência. Provavelmente, estas explicações surgiram na tentativa de conciliar a narrativa do livro de Atos com o relato do evangelho de Mateus, uma vez que, através destas interpretações, nenhum modo específico de morte pode ser atribuído à narrativa de Mateus. No entanto, tais tentativas não são bem fundamentadas e não têm sido bem recebidas pelos estudiosos em geral.

Uma outra tentativa de conciliação entre estas duas narrativas é a que sugere que os relatos do evangelho de Mateus e do livro de Atos são descrições de diferentes fases da morte de Judas Iscariotes. A teoria propõe que Judas se enforcou com uma corda ou em um galho que se quebrou, fazendo com que ele caísse e resultando nas condições descritas em Atos. Esta interpretação tem sido satisfatória para alguns estudiosos, mas outros a consideram apenas uma tentativa de harmonizar os relatos bíblicos a qualquer custo, mesmo que isso comprometa a honestidade.

CONCLUSÃO:

É correto afirmar que o problema permaneceu praticamente sem solução nos tempos antigos; e para muitos intérpretes, é nesse ponto de insolubilidade que o problema se encontra até hoje. No entanto, todas as narrativas, incluindo as lendárias, concordam que Judas Iscariotes sofreu alguma forma de morte violenta e horrenda. Isso parece apropriado, considerando o seu crime inominável, que sem dúvida foi paralelo ao horror de sua morte. Tanto o evangelho de Mateus como a narrativa de Lucas no livro de Atos, veem nisso o cumprimento de profecias bíblicas relacionadas ao traidor de Cristo. (CHAMPLIN, 2014, p. 36).

    

Obras Citadas

Brauch, W. C. (1984). PALAVRAS DIFÍCEIS DA BÍBLIA. Sociedade Bíblica Internacional.

Bullinger, E. (1994). O Companheiro da Bíblia. Kregel Publications em Michigan, EUA, .

CHAMPLIN, R. N. (2014). Comentário do Novo Testamento interpretado ver, por ver (Vol. III). Hagnos.


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